Tem que ter canela e noz-moscada, senão não é cuca!
A caloria pro pão puro de milho é como a da rosca de polvilho, tem que ser bem alta. Agora, pra cuca tem que cuidar: coloca uma palha de milho, se queimar ta muito quente… a folha de bananeira ou uma vassoura molhada pra tirar caloria, senão vai queimar as cucas!
Eram três doceiras me relatando as receitas de cuca, pão de milho, rosquete e rosca de polvilho. Se as outras que eu havia convidado também tivessem vindo, não sei dizer qual seria o resultado de nossa reunião. Discutir receitas entre agricultoras exige muita atenção! Principalmente de quem não é tão familiarizado com esse cotidiano de roça, cozinha e forno.
"Duas pra cinco", "tira quatro" – a discussão das receitas seguia, agora tratando da quantidade de claras e gemas nas preparações, que, segundo elas, é muito diferente caso usem ovos de casa ou não. Cada doceira demonstrava seu próprio jeito! Talvez por isso pareciam tão cuidadosas com a forma como discutiam suas receitas (sabe como é…). Melhor para mim, que intermediava a reunião e tomava notas, para preencher o formulário que poderia proporcionar que particiem do Terra Madre Brasil – Encontro Nacional de Comunidades do Alimento, que aconteceria em Brasília, dentro de alguns meses.
Naquela época, eu havia há pouco concluído minha dissertação de mestrado, pesquisa que me proporcionou conhecer algumas famílias rurais de Maquiné e, a partir da qual, percebi a permanência e a importância do forno de barro na alimentação cotidiana e festiva das comunidades rurais do município. Foi também a partir da vivência acadêmica que conheci o Movimento Slow Food. Para mim, esse era o início de uma caminhada e de um convencimento, sobre a necessidade de articular o rural e o urbano, como estratégia de desenvolvimento e qualidade de vida, em ambos os espaços.
Para as doceiras – agricultoras, mães e avós -, a possibilidade da viagem para o Terra Madre despertou um processo de valorização de seu trabalho: "às vezes o pessoal de fora vê as coisas de um jeito que a gente não vê mais… não valoriza mais, sabe">